Entrevista ao Prof.º Alberto Rego – Presidente da Associação dos Grupos Folclóricos do Alto Minholo
1. Como surgiu o seu interesse pelo folclore?
O meu interesse pelo folclore surgiu há precisamente 50 anos, precisamente. Eu não tinha consciência na altura, era um jovem de 17 anos que não tinha consciência do valor que a tradição tem na nossa vida. Hoje sei que, tudo aquilo que se refere com o passado, é importante porque tenho conseguido aprender coisas que não sabia, mas também através disso tenho conseguido dar felicidade e realização a muita gente. E isso é que é importante, ou seja, através de qualquer coisa que nós façamos, consigamos ser felizes e dar felicidade aos outros. Senão vejam: os grupos folclóricos fazem espetáculos que são realizados por rapazes e raparigas, ligados a grupos folclóricos, que têm insucessos como todos nós, que têm frustrações como todos nós, mas fazem espetáculos e o público bate-lhes palmas. Todos nós gostamos que nos batam palmas, não é? Todos gostamos de ser felizes. Através de uma coisa simples que é cantar e dançar, sentem-se realizados.
2. Sabemos que é o presidente da Associação dos Grupos Folclóricos do Alto Minho. Como surgiu esta associação?
Esta associação surgiu há muitos anos. Nós somos de uma terra extremamente dividida, ou seja, as casas têm muros muito altos e achamos que o nosso sítio, o nosso espaço é muito importante. Isto também acontece nas associações e nos movimentos que surgem. Todos acham que são muito importantes no seu espaço. Mas depois, passado uns tempos, quando vamos “caminhando”, percebemos que se não tivermos ligados uns aos outros, não vamos a lado nenhum. Para isso era preciso que existisse uma associação. A autarquia de então, fomentou que os grupos folclóricos dessem força a essa associação que já existia de direito, mas não de facto. Não tinha trabalho desenvolvido nem corpos dirigentes. Até que surgiu a vontade de se fazer. Após algumas incertezas e contratempos, assumi a presidência desta associação e mantenho-me, para mal dos meus pecados, presidente da associação os grupos folclóricos há cerca de 20 anos. O que quer dizer que já é tempo a mais para estar à frente de um associação tão importante e que precisa de muita força e juventude. Esta associação surgiu porque os grupos folclóricos estavam voltados de costas uns para os outros. Vou dar-vos um exemplo: trabalhávamos na mesma escola ou na mesma empresa, mas quando vestíamos o traje estávamos de costas uns para os outros, não falamos uns com os outros. O do grupo A não falava com o do grupo B. Era uma coisa horrorosa e com esta associação, fez-se um trabalho notável no sentido de fazermos trabalhos conjuntos e de conversarmos uns como os outros, discutirmos os problemas uns dos outros.
3. Quantos grupos folclóricos existem no distrito de Viana do Castelo? E qual o grupo folclórico mais antigo do Alto Minho?
Que eu saiba em Viana existem 28 grupos e depois, cada concelho, tem à volta de 6. Ponte de Lima tem mais, mas há outros concelhos que não têm nenhum. São entre 80 a 90 grupos que existem no distrito, mas alguns poderão estar inativos. Houve um grande crescimento de grupos folclóricos mas neste momento, este número tende a decrescer, por diversas razões. Uma delas é porque os jovens estão a emigrar e, estas associações se não tiverem jovens, não têm futuro, por que o folclore é um movimento que implica juventude para ter sucesso. Não estou a dizer que os mais velhos não são úteis, são muito úteis, são o elo de ligação. Quando um grupo se apresenta em placo, se é um grupo de jovens, tem uma dinâmica e uma força; se é um grupo de pessoas idosas, tem outra dinâmica e outra força. É a lei da vida e é natural que isso aconteça. Quanto ao grupo mais antigo, ao contrário do que toda a gente pensa, não foi o Grupo Folclórico das Lavradeiras de Carreço, esse foi o primeiro a ter sucesso e a ter continuidade. Foi um grupo de uma freguesia vizinha, a Areosa, que não tinha nome e que foi o primeiro a ser criado por Abel Viana, mas que acabou por não ter continuidade. Abel Viana, foi um homem muito importante, de saber e de muita ligação à cultura, foi um dos famosos da etnografia e da arqueologia. Abandonou o primeiro projeto e, quando foi lecionar para Carreço, aliou-se a Carlos Sampaio, que foi também um grande dinamizador. Assim, surgiu o primeiro grupo da nossa região, um dos mais antigos do nosso país e a ter sucesso e continuidade, e que ainda hoje se mantem.
4. Dentro do traje à vianesa, quantas variações existem?
É muito complicado dizer isso, mas podemos catalogar que Afife tem o seu traje, Carreço tem o seu traje, Areosa, depois Santa Marta e Meadela têm os seus trajes. Depois, todos os outros derivam a partir destes que eu referi. Portanto, se quisermos definir as terras que têm características próprias são efetivamente estes 5 trajes. Os outros são imitações, são cópias daquilo que foi dito até agora. Naturalmente, estamos a falar do traje à Vianesa, do fato chamado também “à Lavradeira”, que é extremamente interessante e importante, e que não nasceu como está atualmente com estas cores. Hoje é considerado uma peça Barroca, uma peça lindíssima, mas não nasceu assim; ele nasceu de uma simples fraldilha. Ramalho Ortigão, diz-nos isso nas “Farpas” de uma forma preciosa, e depois também Rocha Peixoto, que o traje nasce de um palmo de terra, onde se semeava o linho e de um braçado de lã, rapado de uma ovelha – mas de lã castanha, porque não havia dinheiro para comprara sabão. Estes 2 elementos da natureza foram efetivamente muito importantes para a criação do traje. Depois, ao longo do tempo, foram-se adaptando, foram criando cor, forma-se usando vários produtos da natureza como cascas, folhas, entre outros, para dar cor ao tecido, para tingir. Por exemplo, usavam o sulfato e a forma de fixar a cor era usar xixi. Mas o mais interessante é que no traje à vianesa são utilizadas peças que nem sequer de origem portuguesa são, que é o caso dos lenços. Os lenços são dos países de leste e são chamados de Austríacos ou Austro-húngaros e isto tem a ver com as descobertas, com os açúcares, com as especiarias e com tudo aquilo que nós trazíamos dos países a quem tínhamos dado nova vida. Tínhamos de vender o que trazíamos em excesso e fomos vender para o Danúbio, para a Europa rica, a Europa das “Sissis” e dos “Franciscos” e, dessa gente toda importante que havia na Europa, trouxemos os lenços. Aquilo que hoje sabemos é que o traje à vianesa nasceu muito simples, muito rude, para o agasalho e para proteção do corpo. Foi-se alterando, foi-se criando e mais tarde juntou-se o ouro e que lhe deu mais valor. O traje à Vianesa é um traje vivo e nas outras regiões não chamado de traje vivo. Isto porque o traje à vianesa é usado ainda por muita gente nos dias de hoje, nas festas da Sra. Da Agonia ou noutras festas. É um traje vivo porque as pessoas têm trajes em casa e têm prazer em o usar e usam-no quando querem. Nas outras regiões de Portugal, já só nos grupos folclóricos é que se usa o fato, ou seja, já não o usam para ir a festas, para ir a um funeral ou para ir à missa. Essa é a diferença.
5. Quais são as danças típicas do Alto Minho?
Fundamentalmente é o vira, mas temos as canas verdes, também temos as danças de mazurca, temos as chuças, temos as gotas, mas o principal é o Vira. E o que é o Vira? O Vira é uma dança muito simples, em compasso ternário, que no fundo é uma valsa. Quem sabe dançar uma valsa, sabe dançar o vira. O vira só é uma dança mais rápida, mais na modernidade. Na nossa região introduzimos instrumentos como a concertina e o acordeão e isso veio dar velocidade às danças. Antigamente só se tocava com instrumentos de cordas, clarinetes e outros similares.
6. Tem conhecimento se existem grupos folclóricos que integrem pessoas com deficiência?
Sim, sim, há vários. Por exemplo, conheci um grupo na região de Santo Tirso, em Santa Maria de Reguenga, que tinha um cidadão completamente surdo, que não ouvia nada e dançava e era “primeira figura”. Não era ele que iniciava a dança, mas sabia exatamente o que ia acontecer. Não ouvia a música mas conseguia efetivamente dançar. Existem vários exemplos, com um comportamento muito interessante, muito assíduos e muito eficazes. Aquilo que fazem, fazem-no muito bem. A solução é mesmo integrá-las e faze-los sentir eu podem dar um contributo muito importante.